João Catanho de Menezes - 1942


POR Redação OA

”Na interpretação jurídica, é preciso nunca perder de vista a célebre phrase de Bentham de que na lei as palavras devem pesar-se como diamantes”


João Catanho de Menezes

O Dr. João Catanho de Menezes nasceu na Ilha da Madeira, a 17 de Abril de 1854 e faleceu em Lisboa, a 15 de Maio de 1942. Licenciado pela Universidade de Coimbra, em 16 de Julho de 1879, foi eleito, a 9 de Março 1887, sócio efectivo da Associação dos Advogados de Lisboa. Iniciou a sua actividade com escritório na Rua de S.Julião, nº 110-1°.

Foi membro do Partido Progressista até 1907, tendo sido eleito deputado pela Madeira em 1905 e 1906. Dizia o Dr. Fernando Calixto no elogio histórico do Dr. Catanho de Menezes: “O certo é que não abandonou o Partido Progressista com a República à vista. Abandonou a Monarquia quando ela tomou um rumo menos liberal”.

Em 1914 exerceu durante alguns meses o cargo de Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, tendo seguidamente liderado o Partido Democrático na Câmara dos Deputados e no Senado.

Desempenhou por sete vezes o cargo de ministro, seis das quais com a pasta da Justiça. Nessa qualidade foi responsável pela proposta de lei relativa a crimes de falsificação e tráfico de moeda falsa, que visava punir com maior severidade estes ilícitos e que sujeitou os réus do caso Angola e Metrópole a um júri especial. Tratava-se da Lei nº 1 871, de 16 de Abril de 1926. Enquanto Ministro da Justiça fez aprovar a muito contestada Lei nº 1 662, de 4 de Setembro de 1924, reguladora do inquilinato. A propósito deste diploma, comentava o Dr. Fernando Calixto: “a Lei 1 662 veio permitir ao comércio lisboeta modernizar a Baixa da cidade, com estabelecimentos à altura da importância da cidade”.

Em 1931 foi nomeado árbitro da Câmara Municipal de Lisboa, intervindo no litígio acerca do preço do carvão, que se reflectia no preço da electricidade. “Houve divergências entre os laudos do árbitro da Companhia e do árbitro de desempate. O Governo, tendo a faculdade de resolver em conformidade com qualquer dos laudos,  adoptou o do Dr. Catanho de Menezes, seu adversário político, prestando assim homenagem à sua rectidão” Antes de ser eleito Bastonário, a 19 de Novembro de 1941, para o triénio de 1942-1944 que não chegou a completar, desempenhou na Ordem dos Advogados os cargos de Vogal do Conselho Geral no triénio de 1927-1929, Vogal do Conselho Superior Disciplinar nos triénios de 1930-1932, 1933-1935 e 1936-1938 e Presidente do Conselho Superior Disciplinar de 1939 a 1941.

Aspectos relevantes do mandato (1942)

Por se encontrar gravemente doente, o Dr. João Catanho de Menezes tomou posse do cargo na sua própria residência onde, para o efeito, se deslocou o anterior Bastonário, Dr. Carlos Ferreira Pires, acompanhado de colegas do Conselho Geral e de um funcionário da secretaria. Impossibilitado de assumir a efectividade do cargo, foi o mesmo desempenhado, desde o seu início, pelo Vice-Presidente Dr. Acácio Furtado, que assumiu, igualmente, o seu lugar no Conselho Superior dos Serviços Criminais.

O Conselho Geral neste triénio era composto, para além do Bastonário, pelos seguintes membros: Dr. Acácio Ludgero de Almeida Furtado, 1° Vice-Presidente, Dr. Carlos Zeferino Pinto Coelho, 2° Vice-Presidente e Tesoureiro, Dr. Arnaldo Constantino Fernandes, Secretário, Dr. Adolfo Bravo, Dr. Alfredo Simões Travassos, Dr. Artur de Oliveira Ramos, Dr. Francisco da Silva Lino Carneiro, Dr. Francisco Joaquim Fernandes Júnior, do Porto, Dr. José Gomes Paredes, de Coimbra, Dr. Pedro Goes Pitta e Dr. Rui Gomes de Carvalho, Vogais.

Durante este período pediram escusa os Vogais Dr. Pedro Goes Pitta e Dr. Francisco Joaquim Fernandes. Para o preenchimento da vaga criada pela saída deste último foi eleito o advogado do Porto, Dr. António Pedro Pinto de Mesquita Carvalho de Magalhães.

Na primeira audiência concedida pelo Ministro da Justiça o Conselho Geral foi representado pelo Vice-Presidente, Dr. Acácio Furtado, em substituição do Bastonário, manifestando, na ocasião, “a ideia de que a Ordem dos Advogados só pelos advogados deve ser dirigida. Como é natural aspiração da classe“. Durante este encontro o Ministro da Justiça referiu-se de forma elogiosa à Revista da Ordem dos Advogados que classificou como uma “notabilíssima obra”.

Em Março de 1942 o pelouro da cultura foi entregue aos Drs. Rui Gomes de Carvalho e Artur de Oliveira Ramos, sendo eleito segundo Vice-Presidente o Dr. Carlos Zeferino Pinto Coelho. O corpo redactorial da Revista da Ordem dos Advogados era composto pelo Dr. António Cerqueira, Dr. Adolfo Bravo, Dr. Oliveira Ramos, Dr. César Abranches e o Dr. Pinto de Mesquita.

Durante este período o Conselho Geral tratou de matérias relacionadas com inscrições, laudos sobre honorários, atribuição de subsídios e concessão de pensões tendo defendido ainda, junto do Ministro da Economia, a necessidade de se classificarem como utilitários os veículos dos advogados, dadas as inúmeras deslocações profissionais a que estavam obrigados.

De referir, também, a reunião havida, em Março de 1942, entre o Vice-Presidente da Ordem dos Advogados, Dr. Acácio Furtado, e o Presidente da Ordem dos Engenheiros, que sugerira a conveniência da cooperação da Ordem dos Advogados com as demais ordens no sentido da criação de um fundo comum de previdência. Esta proposta não viria, contudo, a merecer aprovação do Vice-Presidente, nem do Conselho Geral, que alegaram dificuldades na sua concretização dada a diferente regulamentação da Ordem dos Advogados, a sua constituição e a diversidade de fontes de receita. A 8 de Maio de 1942 o Conselho Geral fez-se representar, na cerimónia de doutoramento Honoris Causa do antigo Bastonário Fernando Martins de Carvalho, pelo Dr. Carlos Zeferino Pinto Coelho e pelo Dr. Rui Gomes de Carvalho. Impedido de comparecer, por razões profissionais, o Dr. Acácio Furtado salientou, todavia, a necessidade da Ordem se fazer representar na homenagem, que até então nunca tinha sido prestada pela Universidade de Coimbra a um advogado português e cujo gesto honrava não só o visado, mas toda a classe.

Elogio do Dr. João Catanho de Menezes pelo Dr. Fernando Calixto

Dizia, no seu elogio, o Dr. Fernando Calixto, que “um dos primeiros deveres do advogado é ser cortês, e ninguém foi mais pródigo em urbanidade devida a colegas, juízes e aos adversários que o advogado Dr. Catanho de Menezes”.

Sobre as suas convicções, realçava:

“E sem se importar com o peso da idade – contava então 77 anos – fechando os olhos à nova directriz política do Estado, esquecendo a posição que alcançara e lhe dava direito a um repousado comodismo, fez um caloroso apelo a todos os republicanos para que, sem distinção de classes ou de partidarismos, se unissem na defesa das instituições, no rumo democrático e liberal a que ele havia votado os dilatados anos da sua vida. (…)

Como homem nascido em 1850, manda nele o idealismo da época, uma ingénua admiração por todos os gestos românticos, mesmo os mais despidos de significado prático; enquanto como advogado e político é profundamente um realista que defende com clareza, coragem e precisão os rumos da sua carreira”.

A propósito do exercício da advocacia afirmava, finalmente, o autor do elogio:

“Se pleitear não é seduzir, mas convencer; se pleitear é raciocinar, demonstrar e discutir, o Dr. João Catanho de Menezes foi um advogado exemplar (…). Tenho na minha frente seus escritos forenses e neles há sempre a mesma honrada preocupação de colocar a Lei, na sua verdade, a Doutrina, nas traves mestras de seus esquemas, a Jurisprudência, na gravidade das suas decisões. (…)

E a advocacia é também generosidade …

O Dr. Catanho de Menezes foi um homem generoso, no sentido de favorecer o maior número de pessoas. Cedeu gratuitamente o terreno para a escola do Faial. Manteve, até ao fim da sua vida, aos seus caseiros, as rendas estabelecidas por seu pai. Estimulou, até com prémios que têm o seu nome, a aplicação dos cursos comerciais.

Advogou, 68 anos. E advogar é uma honra.

Advogar é uma honra tão grande, onde se arrisca muitas vezes a liberdade e sempre o sossego. Advogar é criar inimizades. (…)

Penso que deste homem honrado, que foi também um advogado honradíssimo, se pode afirmar:Se alguma vez dobrou ou ajudou a dobrar a vara da Justiça, não foi ao peso de dádivas, ou de conveniência de interesses, mas antes sob os impulsos da sua alma bemformada”.

Texto: Maria João de Figueiroa Rego in “Os Bastonários da Ordem dos Advogados Portugueses”

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